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Menswear: Conversa entre feminino x masculino domina passarelas da temporada de Inverno 20/21

Por Lucas Dias, em Paris

Podemos dizer que a temporada masculina de Inverno 2020/21 foi, de certa forma, marcada pela redefinição dos códigos que definem a masculinidade na moda (e fora dela). Apesar de ser um assunto que já vem sendo abordado na passarela, o tema tomou uma proporção exorbitada entre os designers nessa estação.

A quebra de um padrão de guarda-roupa masculino restrito, pacato e repetitivo que data do século passado tem se transformado aos poucos e se mostra cada vez mais como um importante marco na história da moda dizendo muito sobre futuro e comportamento às novas gerações de designers e consumidores. 

Foi o assunto trazido por Stefano Pilati, que voltou às passarelas como convidado especial da Pitti Uomo em Florença, com seu projeto independente Random Identities.

Random Identities / Reprodução

Random Identities / Reprodução

Assim como o nome de sua marca, Pilati trouxe para o Inverno 2020/21 um estudo sobre a desconstrução do patriarcado, os seus efeitos no comportamento masculino e identidades variadas para uma geração que preza a individualidade, liberdade e que pouco se importa em comprovar e reproduzir comportamentos de uma masculinidade “tóxica” a todo momento.

De maneira similar, Miuccia Prada, Pierpaolo Piccioli (com a Valentino) e Raf Simons também trouxeram em suas coleções esse estudo sobre a juventude e o novo homem analisado através de um novo uniforme. Na Prada, a coleção foi inspirada em uma masculinidade “anti-heróica” e imersa completamente no cotidiano e no mundo real.

Prada / Cortesia

Prada / Cortesia

Alessandro Michele também referenciou o assunto e a desconstrução de tais padrões de masculinidade para o inverno 2020/21. Michele, que foi um dos primeiros risk takers desta geração de designers quando se trata de derrubar e mesclar padrões de gênero desde que entrou na direção criativa da gigante italiana, trouxe uma masculinidade com menos excessos, jovem, sensível e rebelde. Babydoll vestidos babydoll usados com jeans, sweaters cropped usados com calças de alfaiataria, cardigans alongados e malhas decoradas com as frases “Mon petit chou” (meu chuchuzinho em tradução livre do Francês) trouxeram um ar de inocência, nostalgia e leveza trazendo um senso de ironia em contraste com os elementos grunge dos anos 90 e referencias a Kurt Cobain. 

Gucci / Cortesia

Gucci / Cortesia

Raf Simons, por outro lado, olhou para a juventude através de uma perspectiva futurista. Com frases como Solar Youth; They don’t want you to know who you are e Arrival: The future has begun presentes em handmuffs, o designer belga imaginou uma juventude que se sente deslocada, inquieta e parte de outro planeta, com silhuetas de alfaiataria alongada, oversized e impecáveis que combinavam materiais clássicos como lã, malhas e peles com detalhes de plástico transparente e estampas gráficas que são hits da marca.

Raf Simons / Reprodução

Raf Simons / Reprodução

Pierapolo trouxe para a Valentino um desfile com ar mais clássico porém emocionante. Com show da cantora britânica FKA Twigs, a coleção apresentou um olhar mais romântico, melancólico e sensível para o novo uniforme masculino. Estampas gráficas florais apareceram em casacos, sweaters e bolsas e frases como Bad Lover, Good Lover e Need. Need. complementaram looks de alfaiataria em tons neutros, como azul marinho, preto e branco formando uma harmonia perfeita com as letras das músicas de FKA. 

Valentino / Cortesia

Valentino / Cortesia

Jonathan Anderson também tocou no assunto de uma forma mais divertida e libertadora, tanto em sua coleção para a Loewe quanto em sua marca própria, que desfilou no calendário masculino parisiense nesta temporada. Derrubando quase totalmente as barreiras entre o feminino e masculino, a coleção da Loewe trouxe vestidos em lamé, malhas em silhuetas alongadas, estampas e detalhes de plumas coloridas.

Loewe / Reprodução

Loewe / Reprodução

Em um tom mais sóbrio na JW Anderson, o designer trouxe uma investigação de novas formas para o guarda-roupa masculino. Casacos longos e esvoaçantes vieram decorados com a maxi correntes douradas (que também foram usadas nos acessórios na coleção feminina de verão 2020 da marca), peplums e silhuetas alongadas deram o tom na coleção que foi leve e bastante sofisticada.

Jonathan W. Anderson / Reprodução

Jonathan W. Anderson / Reprodução

Glenn Martens também mostrou o mesmo espírito na Y/Project. Em um cenário de festa decorado com balões vermelhos, o desfile, que mostrou looks femininos e masculinos, veio repleto de elementos variados, construções impressionantes, colaboração com a Canada Goose e trouxe de volta hits da marca como os jeans, acessórios e as botas XXL.

Y-Project / Reprodução

Y-Project / Reprodução

Também olhando para o paradoxo feminino/masculino, Rick Owens trouxe o Glam Rock e os anos 80 com força para o seu inverno masculino. Ombreiras exageradas e pontudas, silhuetas femininas e botas plataforma deram o tom na coleção que continuou a mesma narrativa do seu Verão 2020.

Rick Owens / Reprodução

Rick Owens / Reprodução

Na Undercover, Jun Takahashi trouxe uma perfomance-desfile emocionante coreografada por Damien Jalet e inspirada no filme “Trono Manchado de Sangue” de Akira Kurosawa. A coleção, que referenciou e homenageou a cultura japonesa de diversas formas, serviu como complemento para a perfomance e misturou looks masculinos e femininos. Com layering complexo, kimonos e peças utilitárias revelou uma identidade de um nômade moderno, referenciando tradições mais ao mesmo tempo falando para uma juventude hiperconectada e inquieta.

Undercover / Reprodução

Undercover / Reprodução

Em sua coleção para a Dior, Kim Jones fez uma homenagem ao amigo e ícone da moda britânica, o stylist Judy Blame, que faleceu em 2018 deixando um legado incrível para a moda. Seu icônico estilo dandy-meets-punk foi revivido por Kim através de silhuetas alongadas, com uma alfaiataria elegante e elementos como tecidos, broches, bordados e as construções elaboradas que Blame tanto admirava.

Dior Men / Cortesia

Dior Men / Cortesia

Já Olivier Rousteing olhou para a sua própria identidade para o inverno da Balmain. O desfile da marca contou com performances de dançarinos e cenografia impressionante que trouxe a imagem de um deserto para o Grande Halle de la Villette no norte de Paris. A coleção contou com inspirações de um clash de culturas, olhando especialmente para a Somália, Etiópia e França, reveladas como origens de Olivier pelo documentário “Wonder Boy”, que acompanhou o designer na busca da identidade de sua mãe biológica. Sem deixar de lado o glamour e a silhueta afiada – sua marca registrada na Balmain – o designer trouxe uma coleção mais introspectiva e refinada com tons monocromáticos que também brincaram com a alfaiataria e mesclavam códigos masculinos e femininos.

Balmain / Cortesia

Balmain / Cortesia

Após fazer uma pausa, Virgil Abloh retorna com sua quarta coleção para a Louis Vuitton que foi uma consolidação do seu storytelling e códigos como designer. Ainda com estética e cenário escapista, a coleção de Abloh também foi voltada a um realismo e cotidiano moderno e uma masculinidade mais suave. Novidades de uma alfaiataria com uma pegada menos street e mais sofisticada foram surpresa em suas coleções tanto na Vuitton quanto na Off-White.

Louis Vuitton / Cortesia

Louis Vuitton / Cortesia

Além dos nomes já consolidados, o calendário de Paris – que fez história com o maior número de desfiles (53 no oficial e 20 fora dele) – contou com novos nomes e deixou evidente a importância que a cidade tem como o principal foco da indústria. 

Além de JW Anderson, o britânico Craig Green também desfilou pela primeira vez na capital francesa. Ele teve um problema na entrega de sua coleção, que não ficaria pronta a tempo para a semana de Londres, que sempre abre a temporada masculina. Seu desfile, um dos pontos altos da temporada, teve como referência uma observação sobre os “nômades” modernos e as questões sobre políticas de imigração que têm sido ponto crucial de discussão nas sociedades europeias nos últimos anos e já são parte do repertório de estudo de Green.

Craig Green / Reprodução

Craig Green / Reprodução

Entre as marcas da nova geração, GmbH, Ludovic de Saint Sernin e Sankuanz também se destacaram em Paris com coleções carregadas de ideias sobre a nova juventude e masculinidade sem deixar de lado as estéticas e identidades fortes de suas marcas. 

GmBH / Reprodução

GmBH / Reprodução

Ludovic Saint Sernin / Reprodução

Ludovic Saint Sernin / Reprodução

Boramy Viguier e Botter (marca que venceu o Grande Prêmio do Festival d’Hyères 2018) também estrearam em Paris. Boramy focou em uma juventude hiperconectada e uma narrativa de um matrix moderno em suas silhuetas e acessórios.

Boramy Viguier / Reprodução

Boramy Viguier / Reprodução

Já a Botter se inspirou em um futuro sustentável. Detalhes e acessórios feitos de plásticos reciclados e frases como there is no crying in fashion trouxeram à tona o senso crítico porém bem humorado que a marca carrega em seu DNA. 

Botter / Reprodução

Botter / Reprodução

O artigo Menswear: Conversa entre feminino x masculino domina passarelas da temporada de Inverno 20/21 foi publicado pelo FFW.

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